Salve! Nos últimos meses só se fala do Covid-19, o coronavírus. E como todos sabemos, a Itália infelizmente foi bem afetada por ele, o que gerou muitas dúvidas de como tudo aconteceu por aqui. Recebemos inúmeras perguntas sobre esse assunto e aqui vamos contar para vocês, de forma resumida, como tudo foi acontecendo. 

Como tudo começou na Itália

Em janeiro, tínhamos acabado de voltar de nossa visita ao Brasil no meio do mês e tudo ainda era muito vago sobre o Covid-19, praticamente nem se tocava nesse assunto, tudo ainda estava concentrado na China. O assunto começa a esquentar mais perto do fim do mês quando no dia 29 foram encontrados os dois primeiros casos de pessoas infectadas pelo coronavírus na Itália. Eram dois turistas chineses que foram hospitalizados no instituto Spallanzani em Roma (Itália central) e tratados lá mesmo em isolamento. Passados alguns dias, mais precisamente em 6 de fevereiro, foi relatado um novo caso em Roma: um italiano que vinha de uma visita a Wuhan.

Mais alguns dias se passaram, dando a grande impressão de que eram casos isolados, pois eram os únicos em dias. Todos começaram a ficar mais apreensivos por aqui, se teriam mais casos ou se estava tudo sob controle. Não estava nada sob controle, pois no dia 18 de fevereiro, a situação piorou e os primeiros casos de pessoas infectadas com o vírus na Lombardia (norte da Itália) foram identificados e nenhum deles tinha estado na China. 

O primeiro caso positivo foi um homem de 38 anos da cidade de Codogno (grave bem esse nome), uma pequena cidade aqui do norte da Itália. O homem acabou infectando a esposa grávida e um amigo (todos se curaram). Poucas horas depois, dois aposentados foram confirmados positivos ao coronavírus em Pádua, na cidade de Vò, um deles falecendo no mesmo dia, pois infelizmente ele estava com a saúde já debilitada a alguns dias no hospital, internado por outra doença.

No dia 22 de fevereiro, uma senhora é encontrada morta em casa, testada positiva ao coronavírus em exames póstumos. Ela tinha outras doenças e por isso havia passado pelo mesmo hospital em Codogno. No mesmo dia em outra cidade, ainda no norte da Itália, dois médicos são testados positivos. Ainda no dia 22, um outro caso, agora na região da Emilia-Romagna (norte da Itália), de uma senhora de 82 anos é confirmado. A senhora era residente de Codogno. E ainda, um caso em Piemonte (norte da Itália) de um homem de 40 anos que estava em Codogno a trabalho nos últimos dias e teve contato com um dos outros infectados. Na região de Milão, um senhor de 78 anos também testa positivo.

Repare que no dia 22 muitos casos apareceram na Itália e as primeiras medidas foram tomadas. O Primeiro Ministro italiano Giuseppe Conte proíbe o acesso e a saída dos municípios onde haviam os primeiros casos (as chamadas Zonas Vermelhas) e suspende também manifestações e eventos. Já no dia 23 de fevereiro o Carnaval de Veneza foi suspenso.

Nos próximos dias, positivos começam a se espalhar pelo país e chega a 11 o número de mortos no dia 25 de fevereiro. No mesmo dia o Salão do Móvel de Milão de 2020 que aconteceria em abril foi passado para junho (depois foi cancelado e a próxima edição será só em 2021). No dia seguinte (26) a British Airways cancela 22 voos para Milão. Repare que tudo começa a ficar estranho e a tensão aumenta, porém o governo afirma que está tudo sobre controle, os casos estariam todos concentrados nas Zonas Vermelhas e nenhum caso grave no resto da Itália.

Dia 27 o Duomo de Milão reabre aos turistas apenas com vendas de bilhetes online e entrada de pequenos grupos de visitantes por vez. Nesse tempo, em Milão, o prefeito Giuseppe Sala começa a campanha Milano non si ferma (Milão não pára) com o intuito de estimular a economia. Você deve ter ouvido falar dessa campanha que praticamente todos aderiram, subestimando o poder de contágio do Covid-19. Essa campanha se mostrou um verdadeiro “tiro no pé”, pois os casos de positivos aumentaram bastante nos dias seguintes. O prefeito depois pede desculpas e reconhece o erro.

Chegamos a março e o Primeiro Ministro Giuseppe Conte prorroga o decreto, mantendo as Zonas Vermelhas (cidades: Bertonico, Casalpusterlengo, Castelgerundo, Castiglione D’Adda, Codogno, Fombio, Maleo, San Fiorano, Somaglia, Terranova dei Passerini, Vo’).

Em 3 de março, Veneza assim como Milão comete um erro e anuncia o Spritz de graça contra o Coronavírus. Todos os dias do mês de março, das 17h as 20h, na Piazza San Marco, os bares ofereceriam spritz em prol do turismo que havia sofrido uma queda nos últimos dias, inclusive devido as recentes enchentes no local.

Escolas e Universidades fecham no dia 4 de março até inicialmente metade do mês (elas estão fechadas até o momento da publicação dessa matéria). No mesmo dia o Campeonato Italiano de Futebol começa a fazer suas partidas sem público. No dia seguinte todos os concursos públicos de Turim são postergados e a Conferência Episcopal Italiana pede a suspensão das missas na Lombardia, Vêneto, Emilia-Romagna e nas províncias de Savona e Pesano e Urbino. 

Ainda no 5 de março o Presidente da República Sergio Mattarella faz um discurso televisivo e no mesmo dia o Primeiro Ministro libera 100 milhões para a Proteção Civil. No dia 6 surge o primeiro caso no Vaticano e alguns eventos futuros começam a ser cancelados, como o GP de Roma e a final da Copa do Mundo de Sci. Repare que tudo começa a acontecer muito rápido.

Dia 7 de março, as UTIs da Lombardia começam a ficar super lotadas e o problema fica muito sério. Sendo assim, no dia seguinte (8) o Primeiro Ministro aumenta as Zonas Vermelhas para toda a Lombardia e mais 14 províncias italianas (Modena, Parma, Piacenza, Reggio Emilia, Rimini, Pesaro e Urbino, Veneza, Pádua, Treviso, Asti e Alessandria). Nós não saímos de casa desde então, excepcionalmente para ir ao supermercado e farmácia, um por vez, com máscara.

No dia 8 ainda, todos os museus, cinemas e casas de show tem suas atividades suspensas em território nacional. Inclusive o acesso ao Vesúvio é cancelado em Nápoles já no dia 9 de março. Ainda no dia 9, os acessos a Milão começam a ser controlados e a Itália inteira vira Zona Vermelha, inicialmente até 3 de abril, onde todas as medidas anteriores agora são válidas para toda a Itália. Começa a campanha Io resto a casa (eu fico em casa) que está sendo usada em todos os outros países do mundo.

A OMS no dia 11 de março declara o Covid-19 como Pandemia, sendo assim tudo na Itália fecha, em excessão a farmácias e supermercados. No dia 15 voos especiais trazem os italianos que estavam nos outros países para casa.

O dia 1 de abril é marcado pela prorrogação do prazo inicial de bloqueio do país para o dia 13 de abril. No dia 10 a mesma medida é ainda prorrogada mais uma vez, agora para o dia 3 de maio, sendo que no dia 14 as livrarias, lojas de roupas para recém-nascidos e papelarias podem já voltar a funcionar, mas não em todo o território nacional.

Os números do coronavírus na Itália estão melhorando e a situação parece ter chegado finalmente a ter algum controle. Todos os dias as 18h, o chefe da Proteção Civil Angelo Borelli atualiza o país com os números de novos contágios, mortos, curados, pacientes na UTI.

Até o momento da publicação dessa matéria é tudo isso, vamos atualizando.

Supermercados

Algumas dúvidas dos nossos leitores começaram desde que o coronavírus atingiu a Itália. Os supermercados, por exemplo, foram um dos assuntos mais discutidos, com várias informações sobre eles estarem vazios, faltando produtos. Isso aconteceu nas primeiras horas do dia 23 de fevereiro, porém logo depois todos foram reabastecidos e nunca faltou nenhum item. Talvez o fermento está um pouco difícil de achar, ele é um produto vivo que precisa de tempo e com a alta procura as vezes não encontramos mesmo. Supermercados muito pequenos acabam ficando algumas vezes com menos itens, mas sempre tem algum supermercado maior perto, então a dica é ir fazer as compras nesses. Nós, por sorte, temos vários supermercados perto de casa e nunca faltou nenhum item em nenhum deles. 

Para ir ao supermercado, apenas uma pessoa da família sai, com máscara (que se tornou obrigatória na Lombardia e em algumas outras partes da Itália) e faz as compras para 7, 10 dias. Nada de ficar indo toda hora, além disso, é preciso preencher uma auto-certificação explicando a motivação de sair de casa, que dever ter um motivo válido: ir ao supermercado comprar itens de necessidade, ir a farmácia, ir trabalhar (desde que se trabalhe com bens de primeira necessidade) ou para cuidar de alguém que precise, caso se saia de casa sem motivos justos, pode-se tomar uma multa bem salgada. 

A fila nos supermercados era inicialmente bem grande, algumas vezes com horas de espera. Em todas as filas a distância de segurança de um metro entre uma pessoa e outra é respeitada. Alguns supermercados medem sua febre antes da entrada e todos disponibilizam álcool gel e luvas descartáveis obrigatórias para os clientes. Pequenos grupos podem entrar por vez e atualmente as filas já diminuíram bastante, já que aplicativos com senhas (que já se retira em casa) facilitam bastante essa organização. 

Características dos pacientes positivos falecidos para COVID-19 na Itália

Duas vezes por semana, o Istituto Superiore di Sanità publica uma análise dos dados epidemiológicos de pacientes que morreram positivos para o COVID-19 na Itália:

Idade média

78 anos

Sexo 

Homens 67,1% 

Mulheres 32,9%

Patologias prévias no momento da internação

Pacientes com 0 doenças pré-existentes 3,5% 

Pacientes com 1 doença preexistente 14,8% 

  • Pacientes com 2 doenças pré-existentes 20,7% 
  • Pacientes com 3 ou mais doenças pré-existentes 61%

Áreas geográficas com maior porcentagem de mortes 

  • Lombardia com 58,4% 
  • Emilia Romagna com 13,3% 
  • Piemonte com 7,3% 
  • Veneto com 4,5%

Depoimento

A última vez que a humanidade passou por uma situação semelhando foi em 1918 com a gripe espanhola, então claro que é uma novidade (que nos pegou todos de surpresa). Essa quarentena não é uma coisa comum do dia a dia e ficar confinado em casa não é fácil. Aqui nós estamos a uns 40 dias em casa e sendo sinceros, todo dia parece domingo.

Momentos de calma, paz e alegria se mesclam com momentos de desespero, tédio e ansiedade. Nos dias de calma e alegria tentamos cozinhar novos pratos, ouvir música, ler um bom livro, pular corda. Nos dias de desespero e tédio, comemos pão com queijo, assistimos Irmãos a obra na tv e ficamos com a bunda quadrada do sofá. Tentamos não assistir muita tv e nem olhar tanto redes sociais, que estão inundadas de óbvias notícias ruins: pessoas estão ficando doentes, pessoas estão morrendo. E a dúvida que sempre nos assombra é: quando isso vai acabar? Vai acabar algum dia?

Os dias de ir ao supermercado ou lavar roupa se tornaram os grandes eventos da semana, afinal se vamos dormir as 4 da manhã ou acordamos meio-dia não faz mais diferença. Tentamos ser produtivos, temos clientes e os atendemos de casa, mas não é a mesma coisa. Antes, depois de entregar um serviço, saíamos de bicicleta pela cidade e tomávamos um gelato, agora, ficamos sentados no sofá comendo pipoca. 

O que nos resta, o que resta para o mundo, é esperar e torcer para que tudo isso acabe logo, com o menor número de vítimas possível (que já é bastante infelizmente). Nós estamos fazendo a nossa pequena grande parte que é ficar em casa, e pedimos que você faça isso também. Tudo isso vai passar e poderemos todos sair novamente de casa sem medo. Lembrando das vítimas e lembrando sempre dessa experiência para que ela não se repita novamente. Andrà tutto bene! Vai dar tudo certo!

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